Estudo aponta condições precárias em centros de acolhimento no Rio

Crianças e adolescentes que precisam de acolhimento em abrigos ou casas-lares no estado do Rio de Janeiro enfrentam uma realidade cheia de problemas. As estruturas são precárias e há dificuldades para obter itens básicos de higiene, roupas íntimas e medicamentos. A maioria dos acolhidos chega com histórico de violência e não recebe tratamento adequado.
As informações são de um estudo do Instituto Rede Abrigo, em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Os dados serão apresentados ao público no dia 26 de agosto, mas foram antecipados para a Agência Brasil.
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Dos locais de acolhimento, 83,72% são abrigos institucionais e 16,28% funcionam no formato de casas-lares. A maior parte dessas instituições é administrada pelo poder público municipal (75,97%) e atende ambos os sexos (84,50%).
Um dos primeiros problemas identificados no estudo é o de que apenas 53,49% dos lugares de acolhimento abrangem integralmente a faixa etária de 0 a 18 anos. A situação contraria a orientação técnica vigente, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Uma das questões que isso provoca é a separação de irmãos com idades muito diferentes.
A faixa etária predominante nas unidades é de 12 a 17 anos (44,81% dos acolhidos). Sobre o perfil sociodemográfico, 78,29% são crianças e adolescentes negros, 62,72% vêm de favelas ou periferias urbanas e 52,42% têm origem em famílias monoparentais femininas.
Profissionais que trabalham com esse tipo de acolhimento também enfrentam desafios: 28,68% das instituições não oferecem qualquer tipo de capacitação profissional. A ausência de formação contínua foi apontada como a principal dificuldade por 67,44% dos gestores.
Realidade precária
Em nove instituições, o número de vagas excede o limite obrigatório de 20 acolhidos por unidade. Elas estão com 21 ou 25 crianças e adolescentes. Em outras 12 delas, a situação é ainda pior, considerada de superlotação: possuem mais de 30 acolhidos.
Mais da metade dos abrigos apresenta dificuldades na infraestrutura (53,49%). Os problemas mais comuns são nos móveis (41,86%), mofo ou infiltração (37,98%), telefonia e internet (37,98%), sistema elétrico (34,11%), paredes (34,11%) e eletrodomésticos (32,56%). Também foram relatadas falhas em portas, janelas, tetos, pisos, esgoto, gás e casos de infestação de pragas.
Em 18,60% dos abrigos, itens de higiene pessoal são compartilhados pelas crianças. O mesmo acontece no uso de roupas e agasalhos (10,08%), calçados (7,75%) e material escolar (2,33%). Além disso, 3,10% não têm espaço adequado para guardar pertences pessoais. E 32,56% têm dificuldades para fornecer roupas íntimas.
“A predominância do modelo institucionalizado, associada à escassez de recursos, à falta de capacitação das equipes e à fragilidade da infraestrutura, compromete o princípio da proteção integral previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”, diz um dos trechos do estudo.
Violência, educação e saúde
A maioria dos acolhidos (84,43%) sofreu algum tipo de violência antes do ingresso nas instituições, sendo que 63,49% foram vítimas de dois ou mais tipos de violência. A violência psicológica foi a mais comum (72,49%), mas os casos de violência sexual também chamam a atenção, por afetar 21,97% das crianças e adolescentes.
O estudo evidencia que os centros de acolhimento também não estão preparados para lidar com essas situações de maior vulnerabilidade.
Apenas 44,4% das crianças e adolescentes acolhidos recebem acompanhamento psicológico; 51,61% realizam tratamentos de saúde e 51,30% nunca realizaram exame de vista. Um número considerável de instituições relatou dificuldades para obter medicamentos (26,36%).
No campo educacional, 47,06% dos acolhidos apresentam defasagem escolar e 27,51% das crianças em idade de alfabetização não aprenderam a ler e a escrever. Os pesquisadores destacam que o papel das instituições de acolhimento é garantir que crianças e adolescentes estejam devidamente matriculados.
Diante dos dados levantados, os pesquisadores reforçam a urgência de revisão das práticas institucionais, assim como o fortalecimento da rede de proteção e implementação de políticas que garantam efetivamente os direitos das crianças e adolescentes.
“O perfil dos acolhidos reforça a interseccionalidade entre raça, território, pobreza e violação de direitos. O acolhimento, que deveria representar uma medida protetiva temporária, muitas vezes se torna um espaço de reprodução de desigualdades, marcado pela insuficiência de políticas públicas articuladas e pelo baixo investimento na qualificação do atendimento”, diz o estudo.
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